E já lá se vão 25 anos de saudade de nosso Pastor maior.
Maior no tempo, na dedicação, na fé, na conduta ilibada e
no amor ao seu rebanho.
Aos vinte minutos do dia 24 de
maio de 1987, um domingo, falecia no Hospital São Camilo, em São Paulo , aos 75 anos
de idade, o Monsenhor Cid França Santos.
Por quase 50 anos ele esteve à
frente da Paróquia de Bananal.
A causa mortis foi uma parada cardíaca, quatro dias após se submeter
a uma operação de sinusite. Ele também teve complicações advindas do diabetes.
Encerrava-se ali um sofrimento de 40 dias, quando teve de ir para São Paulo
continuar o tratamento iniciado na Santa Casa de Bananal e depois em Barra Mansa. Com
o firme propósito de não ficar longe de sua paróquia, já bastante debilitado
aceitou ir para a capital após insistentes convites da família Naufal de quem
era amigo.
Acolhido com amor e carinho
naquele lar, até nos momentos mais difíceis não hesitava em falar de Bananal
e perguntar sobre as pessoas daqui. Era a prova definitiva do grande amor que
sentia pelo município e seus habitantes.
Naqueles 40 dias a população
rezava e aguardava boas noticias sobre seu estado físico. Infelizmente, elas
acabaram não vindo e a cidade chorou o que já sabia ser uma perda irreparável.
O passamento do Monsenhor Cid representava um imenso vazio no sentimento de gerações de bananalenses. Desde o final dos anos 30 ele se tornara uma referência para as famílias e um exemplo de religiosidade impar.
O passamento do Monsenhor Cid representava um imenso vazio no sentimento de gerações de bananalenses. Desde o final dos anos 30 ele se tornara uma referência para as famílias e um exemplo de religiosidade impar.
Quando o féretro chegou às 10
horas da manhã daquele mesmo domingo, milhares de pessoas se concentraram nas
proximidades da Igreja Matriz do Senhor Bom Jesus do Livramento onde o corpo
seria velado.
O dia nublado parecia refletir o
clima de consternação e profunda tristeza da população.
Às 16 horas, na missa de corpo
presente, cenas de inenarrável emoção se seguiram durante a celebração
presidida pelo Bispo Diocesano, Dom João Hipólito de Moraes, com assistência de
vários padres da Diocese. Dentre eles o Padre de São José do Barreiro, Benedito
França (primo do Monsenhor), Padre José Benedito Barbosa (Ditinho) e Padre Luiz
Carlos Barbosa, que anos mais tarde assumiria a Paróquia local.
Muitas pessoas que conviveram com
Monsenhor Cid discursaram na ocasião, enaltecendo suas virtudes e seu exemplo
de fé, dedicação e amor ao próximo.
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Saída do esquife para o cemitério cercado por milhares de pessoas no entorno da Igreja. FOTO: Marcos Tristão Chargel |
Ao baixar à sepultura a última
homenagem dos bananalenses foi uma estrondosa salva de palmas e o derradeiro
pedido que se repetira por cinco décadas e gerações bananalenses: “Benção,
Padre Cid”.
Em 1937,
a chegada do novo Vigário.

Os bananalenses estavam tristes.
Depois de vários anos presenciavam a partida de um grande sacerdote: o Padre
João Marcondes Guimarães. Quem poderia substituir, naquele ano de 1937, um
padre tão digno como ele?
E eis que surge, no dia 2 de
outubro, um jovem padre de 25 anos proveniente da Paróquia de Sant´Anna em São José dos Campos.
Tratava-se do Reverendíssimo Padre Cid França Santos, nascido naquela cidade em
12 de janeiro de 1912.
Iniciado na vida sacerdotal aos 11
anos, quando entrou para o Seminário Diocesano de Taubaté, ordenou-se padre no
dia 8 de dezembro de 1934.
Logo após a ordenação foi nomeado
Coadjutor de Parahybuna (como era escrito na época) e mais tarde foi
transferido para a Paróquia de Sant´Anna como 2º Vigário, ficando lá por quase
dois anos. De lá veio para Bananal.
Chegou juntamente com seu primo, o
Reverendíssimo Padre Benedito Gomes França, que foi para São José do Barreiro.
Ao chegar, o Padre Cid
demonstrava trazer na bagagem um grande dose de Fé e Esperança, aliada a uma
personalidade forte e marcante que iria, por quase meio século, se fundir à
própria imagem da Igreja na cidade.
No dia seguinte ao da sua chegada,
Padre Cid dirigiu a palavra pela primeira vez aos fiéis que lotavam a Igreja
Matriz. Ao fazer a explanação de seu programa de ação na Paróquia, caiu nas
graças da população.
Ele superou as expectativas de
seus superiores pregando a Palavra de Deus nos pontos mais distantes, numa
época em que os meios de transporte eram precários e as estradas ou caminhos de
acesso eram quase intransponíveis.
Deu prosseguimento ao brilhante
trabalho iniciado pelo Padre João Marcondes na reconstrução da Igreja Matriz,
edificou capelas e idealizou inúmeras obras filantrópicas pelo município.
Exerceu sua Sagrada função em
todos os lugares. Da mais humilde casa à mais potentosa residência, levou
igualmente afeto, amor e carinho, mitigando dores e consolando os padecidos.
No decorrer dos anos ministrou os
sacramentos a várias gerações bananalenses.
A 15 de dezembro de 1952, com 18
anos de sacerdócio, foi nomeado Monsenhor Camareiro Secreto de Sua Santidade o
Papa Pio XII.
Seu acendrado amor por Bananal fez
com que deixasse claro à Igreja que não pretendia sair daqui, abrindo mão de uma
trajetória religiosa que poderia levá-lo a Bispo e, quem sabe, a Cardeal.
Em 1984 os bananalenses realizaram
uma grande festa para comemorar seus 50 anos de sacerdócio e passaram a
aguardar uma data igualmente marcante. Em outubro de 1987 pretendiam
proporcionar ao Monsenhor uma inesquecível homenagem ao completar meio século à
frente da Paróquia do Senhor Bom Jesus do Livramento.
Infelizmente, seu falecimento, cinco meses antes, impediu essa manifestação de amor e agradecimento.
Infelizmente, seu falecimento, cinco meses antes, impediu essa manifestação de amor e agradecimento.
Sepultamento na Igreja: maior homenagem anos depois.
A maior homenagem que se pode
prestar a um Padre que dedica sua vida por décadas a uma comunidade é o seu sepultamento
na Igreja em que exercia o sacerdócio.
Na missa de corpo presente de
Monsenhor Cid muitos bananalenses já se perguntavam por que ele não poderia ser
sepultado na Igreja que chefiou por tanto tempo.
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Missa de corpo presente. FOTO: Marcos Tristão Chargel |
Os esclarecimentos vieram dos
padres presentes e do próprio Bispo Diocesano. Uma norma canônica permite
somente a Bispos, Arcebispos, Cardeais e ao Papa o sepultamento nos Templos
Sagrados.
Entretanto, já naquela ocasião Dom
João Hipólito, ao ser indagado se num futuro próximo poderia haver uma autorização
superior, declarou: “Vou estudar junto aos canonistas esta possibilidade, se
bem que a lei é positiva. Não permite sepultamentos de padres em Igrejas. Mas vou
levar a especialistas do Direito Canônico as circunstâncias que envolvem o caso
do Monsenhor Cid. Um homem que viveu 50 anos numa cidade e se doou totalmente
em prol dessa comunidade para que possa ser enterrado na Igreja de forma que
todos possam, ao entrar, ter ali perto o seu túmulo para orar. Tomarei essa
iniciativa e, se houver possibilidade, naturalmente faremos a trasladação dos
restos mortais do Monsenhor Cid para a Igreja Matriz do Bom Jesus”.
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Saída do esquife da Igreja. FOTO: Marcos Tristão Chargel |
Indagado sobre a posição da
família, o irmão do Monsenhor, Dr. José França Santos (Defensor Público no
Estado do Rio de Janeiro), foi efusivo: “Acho que seria um grande ato de
justiça e de caridade cristã. Aliás, é muito comum que altas figuras do clero,
de um modo geral, tenham a sepultura na Igreja onde efetuaram o trabalho de
Pastor. Se fizerem isso eu, como membro da família, receberia com grata satisfação
e grande prazer. Seria, sem dúvida, uma grande homenagem que prestariam a ele”.
A homenagem acabou ocorrendo mais
de uma década depois de sua morte. Seus restos mortais repousam numa sala ao
lado esquerdo da entrada da Igreja Matriz, junto com algumas recordações em
tributo à sua memória. Dentre elas, uma de suas batinas.
O tempo costuma ser implacável com
aqueles que já se foram, utilizando o esquecimento como uma de suas armas.
Cabe-nos deixar claro às novas
gerações que dentre os muitos que merecem ser lembrados, o solo bananalense
abraça um raro sacerdote que dignificou a Igreja e tudo aquilo que ela
representa.
Nós, que tivemos o privilégio de
ser batizados por ele, de crescer brincando ao seu redor na porta da Igreja e
de aprender os ensinamentos divinos através de seus púlpitos e orações, somos
instados a dar o testemunho de sua profissão de fé.
Monsenhor Cid merece
reconhecimento por tudo o fez por Bananal e sua população.
Seu trabalho frutifica até hoje, a
cada ensinamento que com ele aprendemos e repassamos aos nossos, filhos,
sobrinhos, netos...
Monsenhor Cid França Santos é parte integrante
da história de Bananal e como tal não pode deixar de ser homenageado. E, muito
menos, esquecido.
"Ele está gravado na estrutura viva da Igreja, cujas pedras são os pobres, os humildes, os ignorantes, os que pecam e os que amam,
os esquecidos dos principes, mas jamais os esquecidos de Deus".
os esquecidos dos principes, mas jamais os esquecidos de Deus".
Morris West (Livro "As Sandálias do Pescador")